quinta-feira, 14 de março de 2019

EQUÍVOCOS SOBRE DATAS HISTÓRICAS

Por Manoel Neto Teixeira*

Garanhuns era considerada uma das mais antigas e notáveis povoações da província de Pernambuco. Foi elevada à condição de vila em 1811 e, em 5 de dezembro de 1840, à “cabeça de comarca”. Finalmente, chega à categoria de cidade, através de projeto de lei apresentado pelo então deputado Silvino Guilherme de Barros, conhecido como Barão de Nazaré. Proposta foi aprovada pela Assembleia Provincial em 7 de janeiro de 1879, como a Lei número 1.309, daquela data e ano.

Esse registro consta do nosso livro “Garanhuns – Álbum do Novo Milênio (1811/1916)”, página 64, Polys Editora-Recife, edição 2016. Estamos fundamentados em fontes atualizadas: historiadores Pereira da Costa (Anais Pernambucanos), Alfredo Leite Cavalcanti (História de Garanhuns) e João de Deus Oliveira Dias (A Terra dos Garanhuns).

Dia 8 de março de 2019, a propósito de uma programação do Instituto Histórico de Garanhuns, remetida pelo vereador Audálio Ramos Filho, pelo WhatsApp, fiz a seguinte observação: “É lamentável que alguns companheiros do Instituto Histórico de Garanhuns, esquecendo ou fazendo de conta, que o Dia 4 de fevereiro é a Data Magna, quando a antiga vila alcança o status de cidade. É desconhecimento dos fatos históricos, quando não, a força do conjunto normativo. Essas pessoas vão pagar o ônus desse grave equívoco”.

Ao que retrucou o Sr. Audálio Ramos Filho: “Equívoco é dos que seguem a mentira do 4 de fevereiro, um atentado à historiografia e a lógica, não há sequer um documento que contrarie a Carta Régia, entendo que os que têm conhecimento dos fatos não podem insistir nessa ideologia de defender a mudança que Ivo fez em 1975, aí sim, Manoel, um equívoco premeditado. Lembro que o município é mais que cidade, título honorífico apenas até a República, lamentável que intelectuais do seu porte rebaixem nosso município, mas respeito você como amigo e escritor. Abraço fraternal, Audálio Ramos Filho”.

Caro Audálio: lamento os termos ásperos e deselegantes com que você trata esse tema, tão importante para todos nós, filhos ou não de Garanhuns. Permito-me dizer que o termo “mentiroso” não tem qualquer cabimento. Primeiro, porque trata-se de datas históricas, construídas através de atos legislativos: 11 de março de 1811, quando Garanhuns, termo de Cimbres, erigida em Vila pelo alvará de 10 de março, por solicitação do então governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro, sendo instalada no ano de 1813; segundo, porque a Lei 1.309, de 31 de dezembro de 1878, elevando a vila ao status de cidade, ao que é dado saber, não foi revogada até a presente data, portanto Garanhuns continua sendo cidade, sim, independentemente de nossas vontades ou não, ou do que o caro amigo rotula de “mentira”.

Vale ainda esclarecer: no plano da hierarquia das normas, uma decisão, por exemplo, da Câmara de Vereadores de qualquer município brasileiro só tem validade no âmbito do próprio município, não tem alcance de revogar uma lei estadual; esta seria, como efetivamente o é, atribuição exclusiva da Assembleia Legislativa de cada Estado. Da mesma forma, em relação a uma lei federal, cuja aprovação/revogação são atribuições exclusivas do Congresso Nacional. Este é o plano da hierarquia normativa no Brasil.

Outro equívoco: seu é o termo “ideologia”, sem qualquer cabimento nessa questão. “Equívoco premeditado”,  muito menos. Outro equívoco: Município é mais que cidade. Não há cidade sem município e vice-versa. Outro equívoco primário: cidade nunca foi título honorífico nem este acabou com a implantação da República. Ao contrário, agora em plena República, vemos frequentemente as cidades outorgando o título de “Cidadão Honorífico” a pessoas que se distinguem nos vários campos – na política, nas artes, nas ciências, na literatura, etc. Eu próprio, nascido no antigo distrito de Pau Ferro (Águas Belas), agora Itaíba, aos 7 anos vim estudar no Colégio Diocesano de Garanhuns e, lá para as tantas, fui distinguido com o honroso título de “Cidadão Honorífico de Garanhuns, outorgado pela Câmara Municipal, em 2002.

Equívoco da mesma monta é quando o Sr. Audálio diz: "Os que têm conhecimento dos fatos não podem insistir nessa ideologia de defender a mudança que Ivo fez em 1975". Que mudança?  À época, ao que é público, o Sr. Ivo Amaral era vice-prefeito de Amílcar da Mota Valença. Ainda que fosse prefeito não tinha o poder de derrogar uma lei estadual, como já explicamos.

Como sucessor de Amílcar da Mota Valença, aí sim, já na condição de prefeito, Ivo Tinô do Amaral baixa o decreto 638, de 31 de janeiro de 1979, outorgando a Medalha do Centenário da Cidade de Garanhuns a várias personalidades da política, do magistério, das letras, das artes e dentre os agraciados estava o vereador Audálio Ramos, seu pai. As medalhas foram entregues dentro dos históricos festejos, cujo destaque maior foi a presença do capuchinho Frei Damião, um dos homenageados nas festividades.

Ao completar 80 anos, em 2014, o ex-prefeito Ivo Amaral recebe inúmeras homenagens, inclusive da Câmara Municipal de Garanhuns, então sob a presidência do vereador Audálio Ramos Filho, que assina artigo sob o título "Ivo Amaral, Patrimônio de Garanhuns".

Lembra Audálio?

Vale salientar, por fim, que uma (1811) não anula a outra (1879), ao contrário, se completam e ficam nos anais e registros oficiais. Portanto, independentemente de meras opiniões de pessoas, as datas fazem parte e confirmam a história de uma comunidade, município, estado, nação.

*Manoel Neto Teixeira, jornalista, advogado, historiador, membro da Academia de Pernambucana de Letras Jurídicas.

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