1º ano de governo
Em primeiro ano de governo, Executivo e Congresso deixam pauta conservadora de lado. Reforma da Previdência se tornou prioridade e fez até o governo deixar de lado agenda de costumes que se anunciava como marca de Bolsonaro.
Foto: Wilson Dias / Agência Brasil
O Globo - Natália Portinari
BRASÍLIA — Setores conservadores da sociedade, que ajudaram a eleger o presidente Jair Bolsonaro, defendem alterações legislativas na área de costumes, como a restrição do aborto no Brasil e leis que controlem o conteúdo do que é lecionado nas salas de aula. Essa agenda, porém, não avançou em 2019, pois tanto o governo quanto o Congresso elegeram a reforma da Previdência como a prioridade, deixando de lado bandeiras caras ao conservadorismo.
Deputados defensores da pauta conservadora buscam minimizar a derrota, capitalizando avanços fora do Congresso. A bancada evangélica, composta por deputados ligados a igrejas, concentrou esforços em outras áreas, como o Judiciário. Silas Câmara (Republicanos-AM) deu o tom ao dizer em março, quando foi eleito presidente da frente evangélica, que não era o momento para a pauta de costumes no Congresso. Nove meses depois, ele acredita que, ao contrário do que se diz, essa agenda avançou, mesmo que isso não se traduza na elaboração de leis:
— Só funciona para as pessoas (a pauta de costumes) se for lei? Estão fazendo uma avaliação errada sobre a pauta de costumes.
Segundo ele, o diálogo do Supremo Tribunal Federal (STF) com a frente evangélica evitou com que fosse pautado o julgamento para debater a descriminalização das drogas em 2019. No julgamento em que a prática de homofobia foi considerada equivalente ao crime de racismo, Câmara enxerga outra vitória: “um acórdão que garante liberdade de culto e de expressão".
— A Bíblia diz que você paga pelo que faz e o que deixa de fazer. Foi nosso diálogo com o STF que fez com que não fosse pautada a questão das drogas — afirma o deputado.
Proposições legislativas que eram esperadas no início do ano, porém, não foram levadas adiante. A ministra Damares Alves, por exemplo, disse no fim de 2018 que elaboraria uma nova versão do Estatuto do Nascituro, desincentivando mulheres estupradas a abortar. Não foi para frente. Ela apoiou ainda a criação de uma frente parlamentar pelo ensino domiciliar, outro projeto parado mesmo depois de o governo ter enviado um texto ao Congresso.
O fundador do movimento Escola sem Partido, Miguel Nagib, disse no meio do ano que o grupo ia parar suas atividades, diante do trâmite paralisado do projeto de lei no Congresso. A proposição tinha como finalidade proibir “propaganda político-partidária” na sala de aula.
Aceno fiscal às igrejas
Para o líder eleito do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), a crise interna no PSL, partido do presidente até o fim de 2019, também fez com que a agenda conservadora de costumes não fosse prioridade do Legislativo. No partido, estão alguns de seus defensores mais fervorosos. O Parlamento, então, focou na agenda econômica.
— Acredito que o governo demonstrou que ele delegou ao Parlamento a construção da agenda prioritária do Brasil, e o Parlamento optou por uma agenda econômica — diz Efraim.
O deputado Silas Câmara aponta também ações do Executivo que, para ele, são um avanço da “pauta de costumes”. Uma é a militância do chanceler Ernesto Araújo com países cristãos para defender a liberdade religiosa em países onde evangélicos e católicos são perseguidos por outros grupos. Está agendada para o ano que vem uma viagem de líderes de igrejas brasileiros a países árabes para debater o assunto, diz o líder da bancada.
Neste ano, uma das prioridades da bancada evangélica foi a alteração de regras tributárias para igrejas. O governo Bolsonaro fez duas alterações importantes: acabou com a exigência de que cada templo tivesse um CNPJ próprio (agora, o da sede pode ser usado nas filiais) e aumentou o teto de R$ 1,2 milhão para R$ 4,8 milhões para organizações dispensadas de apresentar declarações trimestrais.
Temas polêmicos na gaveta:
Estatuto do Nascituro
A ministra Damares Alves chegou a dizer antes da posse que seria enviado um projeto desincentivando mulheres estupradas a abortar. Ela chegou a citar a medida como “a mais importante” de sua pasta. O governo, porém, não encaminhou a medida e os projetos que tratam do tema no Congresso não saíram do lugar ao longo do ano de 2019. Outras propostas que visavam restringir as hipóteses de aborto legal também não tiveram andamento no Legislativo.
Escola Sem Partido
A proposta ficou parada durante todo o ano e somente às vésperas do recesso o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), recriou uma comissão especial para discutir o projeto, que tem como finalidade proibir “propaganda político-partidária” em sala de aula. O fundador do movimento, Miguel Nagib, disse no meio do ano que o grupo ia parar suas atividades, por falta de andamento da proposta no Congresso.
Ensino domiciliar
O governo desistiu na última hora de mandar por Medida Provisória alteração legislativa para regulamentar a prática que permite aos pais promover em casa a educação de seus filhos, sem necessidade de matriculá-los em escolas. O tema foi enviado por projeto de lei e ficou parado nos escaninhos da Câmara.
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