No Brasil, considerando a renda das famílias, 47,3 milhões de brasileiros terminaram o ano passado na pobreza. O número equivale a 22,3% do total da população brasileira, o maior percentual em dez anos.
"O Brasil vinha numa trajetória histórica de redução da pobreza, mas no meio do caminho, apareceu uma pedra, a pandemia, e ainda estamos vendo os seus efeitos", afirma o economista Paulo Tafner, presidente do Imds.
Analisados no detalhe, os dados do levantamento mostram que a piora foi generalizada. Quase 11 milhões caíram na pobreza em todo o país em 2021. Para se ter uma dimensão desse contingente, é como se quase todos os moradores da cidade de São Paulo se tornassem pobres em um ano.
Mais da metade dos que perderam renda, 6,3 milhões, caiu para a extrema pobreza, onde o dia a dia é marcado até pela falta de comida. O ano terminou com 20 milhões de brasileiros nessa condição.
Na avaliação da equipe do Imds, um fator para a oscilação na renda foi o auxílio emergencial. A concessão de um benefício de R$ 600 em 2020 teve o efeito de reduzir a pobreza. No ano passado, porém, o auxílio foi suspenso e, depois, teve o valor reduzido, além de ter um corte no número de beneficiários. Como a Covid não havia cedido, e a economia tão pouco reagido, houve repique na pobreza.
No Maranhão, o auxílio reduziu a pobreza em 2020, que passou a afetar 37% da população. É um patamar alto, mas foi o menor percentual de maranhenses empobrecidos em 10 anos. No ano passado, porém, a parcela de pobres passou a ser 48,5%, quase metade da população, e o pior patamar nos mesmos dez anos —3,5 milhões terminaram 2021 na pobreza.
Montanha russa parecida ocorreu no Rio Grande do Norte. A parcela de pobres caiu para 24% em 2020, e saltou para 34,5% no ano passado. Outra vez, piso e teto em dez anos.
Pernambuco viveu um fenômeno diferente. Não teve redução drástica de pobreza em 2020, mas sentiu o repique na sequência, fechando 2021 com quase 44% da população na pobreza, 4,2 milhões de pernambucanos.
LIÇÕES PARA A POLÍTICA PÚBLICA
Na avaliação do Imds, os efeitos sobre o Brasil do baque global da pandemia, seguido das consequências da guerra da Ucrânia, que também estão afetando a economia em escala internacional, mostram que a política pública na área social no Brasil precisa avaliar a criação de novos instrumentos.
"Muitas famílias vivem com uma renda tão pequena que podem cair abaixo da linha da pobreza se deixarem de ganhar regularmente R$ 2 por dia", afirma Tafner. "Mecanismos simples, como um seguro social para mitigar choques, poderiam impedir esses efeitos."
Outra alternativa seria construir um sistema de seguridade para o trabalhador informal. "Na pandemia, quem tinha trabalho com carteira assinada foi atendido mais rapidamente porque conta com estruturas de proteção já organizadas", diz Guimarães. "Um sistema para os informais evitaria a pobreza temporária, causada pela falta repentina de trabalho."
CRITÉRIOS DA PESQUISA
As séries do Imds que contabilizam pobreza tomam como base a renda per capita familiar (por pessoa) apurada a partir das séries da Pnadc do IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O levantamento foi iniciado em 2012.
O Imds fez uma linha histórica da pobreza estimando dados da antiga Pnad (1992-2015) com a atual Pandc. Nessa projeção de longo prazo, o nível de pobreza de 2021 é comparável ao registrado em 2010, mas praticamente metade do indicador nos anos de 1990, quando a pobreza chegou a atingir 40% da população.
A linha de corte para pobreza é a mesma adotada pelo Banco Mundial, viver com renda diária no valor de US$ 1,9, cerca de R$ 10, ou menos que isso.
Os levantamentos regionais e para estados consideram os efeitos sobre o rendimento do custo de cestas básicas de consumo local. Os critérios foram desenvolvidos por IBGE, Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe). Seus valores são atualizados pela INPC, índice de inflação que afeta mais a baixa renda.
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