Por Junior Almeida
A semente da campanha da fraternidade é de 1961, quando três padres da Cáritas brasileira pensaram numa maneira de arrecadar fundos para suas atividades pastorais. Na quaresma de 1962 os religiosos puseram em prática a idéia, e foi assim realizada a primeira campanha da fraternidade do país, em Natal, Rio Grande do Norte. Já no ano seguinte, 16 dioceses nordestinas entraram na campanha, com seu tema sempre anunciado na quarta-feira de cinzas.
Em 55 edições, incluindo a desse ano, em apenas três oportunidades o tema da campanha foi ligado à ecologia. A primeira vez foi em 2004, quando a Igreja procurou alertar para o consumo irresponsável da água, o tema foi “Fraternidade e Água”, com o lema “Água, Fonte de Vida”, e em 2007, quando o tema foi “Fraternidade e Amazônia”, e seu lema “Vida e Missão Neste Chão”, para chamar a atenção do perigo que sofria o pulmão do mundo.
A campanha desse ano é mais direta, ecologicamente falando, ao lembrar dos biomas do Brasil, desde a Floresta Amazônica, o cerrado e a nordestiníssima caatinga. O tema de 2017 é “Biomas Brasileiros e Defesa da Vida”, com seu lema “Cultivar e Guardar a Criação.”
Em Capoeiras, em uma lotada Matriz de São José, o padre convidado para celebrar a missa da noite, José Emerson, que é diretor do Colégio Diocesano de Garanhuns, foi muito feliz nas suas palavras durante a homilia, quando lembrou de como era a natureza há pouco tempo atrás, e de como está nos dias atuais, mudada para pior, por culpa do homem.
O religioso, exemplificando como a natureza mudou, disse que quando era criança na cidade de Palmeirina, enquanto a mãe lavava roupa num riacho da localidade, ele e mais alguns meninos tomavam banho nas águas desse córrego, mas, hoje em dia, menos de quarenta anos depois, o que era água limpa pra lavar roupa e tomar banho, não passa de um esgoto da cidade. Padre José Emerson complementou dizendo que tudo que fizermos à natureza, ela nos cobra depois.
O que o padre José Emerson nem os religiosos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, talvez não tenham se dado conta, é que tudo que está se falando esse ano na campanha da fraternidade, um sacerdote nordestino já falava há mais de 100 anos. Sim. O polêmico e venerado Padre Cícero Romão Batista, para muitos um coronel, um coiteiro de cangaceiros, para milhões, um santo, mas, para todos, reconhecidamente, homem à frente de sua época.
Quando ninguém nem sonhava em falar em ecologia, o Padim já se preocupava com as agressões dos homens à natureza. Tanto em suas pregações para as multidões, quanto com conselhos individuais, o sacerdote recomendava sempre o bem viver com a natureza. Na “Meca do Nordeste", ainda hoje é encontrado em quadros, flâmulas ou livretos, os famosos preceitos ecológicos do Padre Cícero. Diz o texto:
1. – Não derrube o mato nem mesmo um só pé de pau.
2. – Não toque fogo no roçado nem na caatinga.
3. – Não cace mais e deixe os bichos viverem.
4. – Não crie o boi nem o bode soltos; faça cercados e deixe o pasto descansar para se refazer.
5. – Não plante em serra acima nem faça roçado em ladeira muito em pé; deixe o mato protegendo a terra para que a água não a arraste e não se perca a sua riqueza.
6. – Faça uma cisterna no oitão de sua casa para guardar água de chuva.
7. Represe os riachos de cem em cem metros, ainda que seja com pedra solta.
8. – Plante cada dia pelo menos um pé de algaroba, de caju, de sabiá ou outra árvore qualquer, até que o sertão todo seja uma mata só.
9. – Aprenda a tirar proveito das plantas da caatinga, como a maniçoba, a favela e a jurema; elas podem ajudar a conviver com a seca.
10. – Se o sertanejo obedecer a estes preceitos, a seca vai aos poucos se acabando, o gado melhorando e o povo terá o que comer. Mas se não obedecer, dentro de pouco tempo o sertão todo vai virar um deserto só.
Nenhum comentário:
Postar um comentário