Estávamos eu e o meu marido, preocupados
com um velho amigo, pois já há alguns dias nós não o víamos nem sabíamos
notícias dele. Frequentador assíduo de uma danceteria, sempre se encontrava
juntamente com o seu par, na mesma que nós frequentamos em Coimbra. Perguntei
ao meu marido se eles são namorados e o mesmo falou-me que não, mas que todos
os domingos ele encontram-se para dançar, conversar etc. isso já faz muitos
anos. Achei interessante a história deles e admirei aquele laço de amizade que
une um homem e uma mulher de meia idade, sem laços, mas ao mesmo tempo
enlaçados por um companheirismo nunca visto em muitos casais.
Ele na casa dos mais de setenta anos é divorciado há muito tempo, e mora
sozinho. Ela, também sozinha, leva uma vida calma em sua quinta, a cuidar do
dia a dia dos animais e plantações. Têm vidas distintas e ao mesmo tempo tão
dependentes um do outro, mas só para dançarem aos domingos.
Certa vez, vinhamos nós da casa de uma amiga comum, quando encontramos o
nosso amigo. Grande e maravilhosa surpresa! Paramos o carro e ele aproximou-se
nos cumprimentando alegremente, e o meu marido tacas-lhe a pergunta que não
quer calar: - E aí, meu amigo, nunca mais nós o vimos lá na danceteria, o que
houve? Já não danças mais?
Ele nos olha seriamente e responde: - A minha companheira de dança está
doente, operou a bacia, e assim eu não posso ir dançar. Meu marido insistindo
diz: - Mas lá o que não falta é par para tu dançares... Ele nos olha sério e
responde: - Faz cinco anos que venci dois cancros, e ela, como boa amiga que é
deu-me toda a assistência que eu precisava, agora chegou a minha vez de
agradecer-lhe e fazer por ela o mesmo. Venho até a sua casa, cuido da quinta,
arrumo tudo para ela, até que fique boa e possamos voltar a dançar. Somos um
par!
Ficamos olhando aquele homem simples e tão cheio de ricos sentimentos,
sem sabermos o que falar. A emoção embargou a nossa voz. Meus olhos encheram-se
de lágrimas e vi a beleza de uma amizade construída com pilares sólidos e um
amor maior do que tudo. Aquele par realmente guarda uma riqueza preciosa dentro
deles, a amizade verdadeira, o amor ao próximo e principalmente a gratidão,
coisa tão rara nos dias de hoje. Desejamos melhoras para a sua companheira de
danças e seguimos o nosso caminho conversando sobre a lição de amor que nós
ouvimos daquele amigo, que para nós foi um grande e caríssimo presente, que ele
nos ofertou.
Ao chegarmos a casa, ainda impressionados com tudo o que tínhamos
ouvido, o meu marido começou a escrever a história deles. Ficou linda! O texto
foi publicado no Diário de Coimbra, o que nos deixou muito felizes, em saber
que milhares de pessoas tiveram a oportunidade de lerem história tão bela e
rica de sentimentos. Verdadeiro exemplo para nós, nesses dias de egocentrismos
em que estamos vivendo. Cada um se preocupando com o seu próprio umbigo e
esquecendo que a felicidade, basicamente consiste em fazer a felicidade de
outrem.
Dia desses, fomos à danceteria e lá estavam o nosso amigo e o seu par.
São sempre os primeiros a começarem a dançar. São perfeitos. Ela recuperou-se
bem e voltaram a dar o show de dança que costumam.
Na entrada da danceteria chama a atenção o artigo que o meu marido
escreveu sobre eles, recortado do jornal, destacado num mural de vidro para que
todos ao entrarem tenham a oportunidade de lerem O par.
Quiçá todos os homens conhecessem ao menos o mínimo do amor!
Lígia Beltrão
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