sábado, 26 de dezembro de 2020

STF pode limitar alcance das ações civis públicas

 

Do Estadão

No início da pandemia do novo coronavírus, uma ação julgada em Brasília determinou que planos de saúde fossem obrigados a prestar atendimento de urgência e emergência a todos os pacientes, independente do prazo de carência previsto em contrato. Se fosse considerar ao pé da letra o artigo 16 da Lei de Ação Civil Pública, a decisão valeria apenas para o lugar em que foi proferida: ou seja, na capital do País. Mas uma ação coletiva proposta pela Defensoria Pública do Distrito Federal garantiu que a regra valesse para qualquer brasileiro.

A abrangência territorial das chamadas Ações Civis Públicas (ACP), meio processual de defesa de interesses da sociedade, ainda não é consenso na Justiça, apesar do caso de Brasília. O tema vem sendo alvo de discussões há pelo menos duas décadas, segundo analistas ouvidos pelo Estadão. Mas o Supremo Tribunal Federal (STF) mostrou disposição em dar um basta no assunto e responder se decisões acerca de ações coletivas têm alcance nacional ou se estão limitadas ao Estado onde foram julgadas. Um julgamento chegou a ser pautado para o último dia 16, mas foi adiado.

Hoje, há 438 mil ações coletivas registradas no Cadastro Nacional de Ações Coletivas (Cacol), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Se a Corte entender que as decisões valem para todo o território nacional, esse número teria uma redução “drástica”, já que não haveria necessidade de análise de ações autônomas, diz João Paulo Carvalho, defensor público e coordenador do Núcleo de Defesa do Consumidor. “O principal efeito nacional é a agilidade, a celeridade no cumprimento da decisão. O direito já estaria reconhecido. Nos Estados, podemos nos beneficiar daquela decisão e apenas pedir o cumprimento.”

O caso dos planos de saúde é de abril deste ano, mês em que o País bateu a marca das 400 mortes diárias por coronavírus. Na prática, a ideia de dar abrangência nacional à decisão evitaria que ações sobre o mesmo tema fossem julgadas em outros Estados e tivessem resultados divergentes em outros tribunais – embora os consumidores tenham os mesmos direitos. A questão foi que o ministro Alexandre de Moraes suspendeu, em março deste ano, todos os processos que discutiam a abrangência do limite territorial para as decisões proferidas em ação civil pública, já que o Supremo ainda vai dar seu parecer sobre o assunto.

Modelo

A tese que seria discutida pela Corte tem origem em uma outra ação, ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) contra 16 instituições financeiras. Nela, o Idec questiona a cláusula de um modelo de contrato do Sistema Financeiro Habitacional e pede a nulidade de todos os contratos, independente de localização, já que se tratava de consumidores de diferentes Estados do País.

Quando se discutia a liminar, houve uma decisão no processo tratando sobre abrangência territorial. O TRF3 decidiu pela abrangência nacional, mas os bancos recorreram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). A 3.ª Turma do STJ aplicou o artigo 16 para limitar a abrangência, e o Idec foi à Corte Especial do STJ, que decidiu pelo alcance nacional. Foi essa última decisão que justificou a interposição de um recurso extraordinário para o STF.

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