segunda-feira, 24 de março de 2025

A criminalização da Presidência da República

 

Foto: Reprodução

Por Edmar Lyra

Desde a redemocratização, o Brasil teve nove presidentes, mas apenas três concluíram seus mandatos sem responder a processos judiciais: José Sarney, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Outros dois, Fernando Collor e Dilma Rousseff, sofreram impeachment, enquanto Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer foram presos. Agora, cresce a expectativa de que Jair Bolsonaro também acabe detido, desta vez sob a acusação de envolvimento em uma tentativa de golpe relacionada aos atos de 8 de janeiro de 2023.

A frequência com que ex-presidentes enfrentam problemas com a Justiça revela um padrão preocupante: a criminalização da Presidência da República. Em pouco mais de três décadas, a maioria dos que ocuparam o cargo máximo do país se viu no centro de investigações, processos e até prisões. Mais do que a responsabilização individual de políticos, esse fenômeno levanta dúvidas sobre o funcionamento das instituições e o futuro da democracia brasileira.

A possível prisão de Bolsonaro representa um novo marco nesse contexto. Enquanto Michel Temer e Lula foram detidos sob acusações de corrupção, o ex-presidente enfrenta um cenário distinto: pode ser preso por suposta participação em uma tentativa de golpe, mesmo estando nos Estados Unidos no dia dos atos. Essa situação reforça a tese de que a Justiça tem sido cada vez mais utilizada como um instrumento de disputas políticas, ampliando a polarização e tornando a estabilidade institucional ainda mais frágil.

A crescente judicialização da política cria um efeito colateral perigoso. Governantes passam a administrar o país sob a sombra de futuros processos, o que pode levar a decisões mais voltadas para a autopreservação do que para o interesse público. Ao mesmo tempo, juízes e procuradores ganham protagonismo no cenário político, ultrapassando os limites naturais de seus cargos e influenciando diretamente o destino de líderes eleitos.

Isso não significa que irregularidades e crimes devam ser ignorados. A lei deve ser aplicada de forma igualitária e sem viés político. No entanto, quando a exceção se torna regra, é preciso questionar se o problema está nos indivíduos ou no próprio sistema. Se a cada novo governo o país se vê diante de mais investigações, prisões e processos, será que o Brasil está escolhendo mal seus presidentes ou está preso em um modelo político e institucional que incentiva esse ciclo? A resposta a essa pergunta pode definir o futuro da democracia brasileira.

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