sábado, 29 de março de 2025

O precedente perigoso da decisão do STF contra Bolsonaro

 

Foto: Divulgação

Por Edmar Lyra

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de tornar Jair Bolsonaro réu pode ter consequências políticas e jurídicas que vão muito além da figura do ex-presidente. Embora a medida seja celebrada por adversários e parte da opinião pública, há um ponto central que precisa ser discutido com seriedade: a fragilidade jurídica da decisão e o risco que ela representa para a credibilidade das instituições.

Bolsonaro deixou a Presidência da República em 31 de dezembro de 2022. No ordenamento jurídico brasileiro, o foro por prerrogativa de função só se aplica a atos praticados durante o exercício do mandato e em razão do cargo. Com isso, a competência para processá-lo deveria ser da primeira instância, e não do STF. A Corte, no entanto, optou por manter o caso sob sua jurisdição, o que abre espaço para questionamentos sobre motivação política e falta de observância ao devido processo legal.

Essa não é uma questão meramente técnica, mas um precedente perigoso. Quando um tribunal altera as regras do jogo de acordo com as circunstâncias, ele mina a previsibilidade do sistema jurídico e fragiliza a segurança jurídica. Se a regra para Bolsonaro pode ser diferente da aplicada a outros ex-presidentes e autoridades, qual a garantia de que não será utilizada no futuro contra qualquer adversário político do momento?

Além disso, há dúvidas sobre a solidez probatória da acusação. Os crimes imputados a Bolsonaro — como tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito — exigem prova concreta de que ele tenha articulado um plano para derrubar o governo pelas vias ilegais. Até o momento, o que se apresenta são discursos polêmicos e críticas ao sistema eleitoral, o que, por mais que sejam reprováveis, não necessariamente configuram crime. Se um líder político pode ser condenado com base em ilações e não em provas robustas, isso abre um precedente perigoso para qualquer ator político no futuro.

Do ponto de vista eleitoral, a decisão pode parecer um golpe fatal para Bolsonaro e seu grupo político, mas pode ter o efeito inverso. Se a narrativa de perseguição se consolidar, a direita pode se reorganizar em torno da vitimização do ex-presidente, pavimentando o caminho para que uma nova liderança — talvez ainda mais radical — surja como herdeira de seu eleitorado. A história recente já mostrou que a tentativa de eliminar um adversário pelo Judiciário nem sempre resulta na sua desmoralização, podendo, ao contrário, fortalecê-lo.

O STF pode ter tomado uma decisão que, no curto prazo, agrada a muitos. Mas, no longo prazo, a fragilidade jurídica desse julgamento pode comprometer a credibilidade da própria Corte e reforçar a tese de que o sistema de Justiça brasileiro se tornou um ator político. E quando a Justiça se confunde com a política, quem perde é a democracia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário