Por Edmar Lyra
A volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos já começa a produzir efeitos diretos na relação com o Brasil — e os sinais são preocupantes. Em um momento de fragilidade econômica global, o país se vê diante do risco de uma crise comercial com sua segunda maior parceria econômica, justamente em um cenário no qual o pragmatismo deveria prevalecer sobre os impulsos políticos e retóricos.
Trump não tem escondido sua insatisfação com o Brasil. Suas críticas recentes vão desde o crescimento do Pix — que ele vê como ameaça às big techs e ao mercado financeiro americano — até a acusação de conivência do país com pirataria, citando diretamente o comércio popular da Rua 25 de Março. Embora esses episódios possam parecer superficiais ou folclóricos, eles revelam algo mais profundo: a reconfiguração da política externa americana sob Trump, agora ainda mais voltada para o protecionismo, a unilateralidade e a punição a países que, em sua visão, competem de forma “desleal” com os interesses dos Estados Unidos.
A ameaça de impor tarifas ao Brasil não surge de um conflito pontual, mas de uma lógica econômica e geopolítica mais ampla: Trump vê o comércio internacional como uma disputa de forças, onde não há aliados duradouros, apenas interesses. Dentro dessa lógica, o Brasil se tornou um alvo — não por algo que tenha feito contra os EUA, mas pelo simples fato de ocupar espaços estratégicos em setores como alimentos, energia, serviços financeiros e tecnologia. O sucesso do Pix, por exemplo, representa para Trump não uma inovação brasileira, mas uma perda de espaço para empresas americanas. Isso é parte de uma visão distorcida, mas que mobiliza sua base política e pode embasar medidas econômicas punitivas.
O governo brasileiro ensaiou uma resposta firme, cogitando medidas de reciprocidade e tarifas sobre produtos americanos. Contudo, ao perceber a gravidade da situação e a assimetria da relação, recuou. E fez bem. Os Estados Unidos representam cerca de 15% de toda a corrente de comércio exterior do Brasil, enquanto o Brasil representa apenas cerca de 1,5% do comércio total americano. Isso significa que qualquer escalada terá um impacto muito mais danoso ao Brasil do que aos EUA. Setores como o agronegócio, a indústria de aviação e até a atração de investimentos diretos seriam os primeiros a sofrer os efeitos de um ambiente hostil.
O risco não é apenas econômico, mas político. Em busca da reeleição em 2026, o presidente Lula precisa preservar a estabilidade macroeconômica. Uma crise comercial de grandes proporções com os Estados Unidos — ainda mais provocada por fatores ideológicos ou impulsos momentâneos — pode desorganizar o câmbio, pressionar a inflação, travar investimentos e, sobretudo, minar o humor do eleitorado. A oposição certamente explorará qualquer sinal de isolamento internacional para fragilizar sua imagem.
Mais do que resistir ou reagir, o Brasil precisa responder com diplomacia e inteligência. Esta não é uma guerra entre líderes ou entre ideologias. É uma disputa por espaço em um mundo cada vez mais protecionista. E, nela, vencerá quem souber jogar com estratégia, e não com bravatas.
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