domingo, 1 de outubro de 2023

A segurança pública tem heróis e cebolas

Por Felipe Sampaio

Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

O general Naranjo entrou na sala de reuniões da Secretaria Nacional de Segurança Pública, na última terça-feira, com a humildade característica dos heróis. Afinal, heroísmo exige empatia.

A conversa foi organizada pela própria SENASP com apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, aproveitando a presença do oficial da polícia colombiana em um evento aqui no Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Conhecer o General de Polícia Oscar Naranjo teve um gostinho de momento histórico. Naranjo ficou conhecido por sua participação no desmantelamento do cartel de Medellín que, culminou na morte do traficante Pablo Escobar. Também atuou nos acordos de armistício com os guerrilheiros das FARC.

Antes de ser o vice-presidente do seu país, chefiou a inteligência e comandou a polícia colombiana por cinco anos. Na Colômbia, diferente do Brasil, a polícia é nacional e tem generais. Naranjo, por sinal, foi o primeiro agente da Polícia Nacional a alcançar o posto de general quatro estrelas.

Na reunião desta semana, presenteou o Secretário Nacional de Segurança Pública Tadeu Alencar com seu novo livro (Se Creían Intocables, publicado em 2021), que na introdução traz a citação de uma poetisa mexicana “Escolhemos as cebolas com que choramos”. Com esta frase Oscar Naranjo ilustra seu argumento de que não faz sentido falar em guerra à criminalidade porque os cidadãos e suas comunidades, especialmente os mais pobres, acabam sofrendo no fogo cruzado dos combates.

O colombiano nos contou que duas questões centrais devem orientar o conceito de segurança pública. Uma delas é a necessidade de dar legitimidade à ação do Estado, especialmente das forças policiais. A população que deveria ser protegida perde a confiança nas polícias e no governo quando “a morte passa a fazer parte da solução”, porque o propósito da segurança pública é garantir a vida e “os fins não justificam os meios”.

A outra questão é o diálogo com a sociedade. Segundo Naranjo, a verdadeira guerra na segurança púbica é a guerra da comunicação. Contabilizar os resultados apenas em termos de prisões de delinquentes ou de apreensões de drogas, por exemplo, não quer dizer nada se as pessoas comuns continuarem convivendo com violência e privações no seu dia a dia.

Para ele, o importante é medir e anunciar os êxitos da segurança pública enquanto recuperação de territórios, restabelecimento da normalidade cotidiana e oferta de bens públicos que promovam a convivência cidadã e solidária.

Nesse contexto, Oscar Naranjo acrescentou que na América o avanço do discurso extremista é preocupante, quando 63% da população declaram não confiar que a democracia seja capaz de resolver os problemas concretos que ameaçam as pessoas. Uma situação que naturalmente deixa como alternativas o crime organizado, o discurso armamentista e os regimes totalitários.

Encerrou nossa conversa enfatizando que os bons resultados da segurança pública dependem de outras políticas sociais, para redução das desigualdades, melhoria da qualidade de vida, oferta de serviços públicos, mobilidade, emprego e promoção da participação popular, sem esquecer do cuidado também com efeitos das mudanças climáticas em curso.

Felipe Sampaio: chefiou as assessorias dos ministros da Defesa (2016-2017) e da Segurança Pública (2018); cofundador do Centro Soberania e Clima; foi secretário-executivo de Segurança Urbana do Recife; atual diretor do SINESP no Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Nenhum comentário:

Postar um comentário