Por Edmar Lyra
O projeto de lei da anistia, em discussão no Congresso Nacional, tornou-se um dos temas mais sensíveis da atual legislatura. O relator, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), deixou claro que não pretende incluir no texto qualquer dispositivo que beneficie diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro. Sua justificativa é simples: não há como individualizar uma anistia em nome de uma única pessoa. “Não dá para individualizar. Como eu vou colocar isso em um projeto de lei? Esse cara aqui eu vou salvar, ou aquele lá eu vou salvar. Não dá para fazer isso. Vou ter que fazer uma coisa genérica, geral para todos”, disse o parlamentar.
A posição de Paulinho reflete a busca por um acordo político de médio alcance, apelidado de “anistia light”, que abarcaria milhares de militantes envolvidos em atos de 8 de janeiro, mas deixaria de fora figuras de maior expressão, como Bolsonaro. Trata-se de uma tentativa de construir uma saída institucional que alivie tensões sem colocar o Parlamento em rota de colisão direta com o Judiciário, onde ainda correm processos que podem culminar na inelegibilidade do ex-presidente.
Entretanto, a oposição não pretende se conformar com essa limitação. O Partido Liberal (PL), legenda de Bolsonaro, tem uma estratégia engatilhada para tentar reverter o cenário. Ainda que o relatório não traga nenhuma menção ao ex-presidente, o PL pretende apresentar destaques de bancada para votar, em separado, trechos que possam beneficiá-lo diretamente. O regimento interno do Congresso permite que, após a aprovação do texto-base, as bancadas apresentem destaques e submetam ao plenário emendas rejeitadas pelo relator. Pelo tamanho de sua bancada, o PL tem direito a quatro destaques desse tipo, e a aposta é usar um deles como a cartada final.
Essa possibilidade preocupa os articuladores do acordo. Caso o destaque seja aprovado, o esforço para limitar os efeitos da anistia pode ruir em plenário, fulminando o pacto costurado nas comissões. Isso porque a votação em separado não depende apenas do relator, mas da correlação de forças no plenário da Câmara, onde a bancada do PL é a maior e pode contar com apoios pontuais de outros partidos.
A estratégia da oposição é arriscada, mas não desprezível. De um lado, pressiona o relator e a base governista a aceitarem negociações mais amplas. De outro, mobiliza a militância bolsonarista, que verá na manobra uma tentativa legítima de resguardar os direitos políticos de seu líder. No entanto, caso fracasse, o movimento pode isolar ainda mais Bolsonaro, confirmando a leitura de que o Congresso não estaria disposto a bancar uma anistia feita sob medida.
O impasse expõe o dilema central: como equilibrar a pacificação política com a necessidade de manter o respeito às instituições? A “anistia light” parecia ser uma saída de consenso, mas a insistência do PL em personalizar a pauta recoloca Bolsonaro no centro do tabuleiro, polarizando novamente o debate.
No fim, a decisão caberá ao plenário. E será nesse momento que se testará até onde vai a disposição dos parlamentares em arriscar a estabilidade do acordo para atender ao apelo de um único nome. O certo é que, entre bastidores e holofotes, a cartada final do PL terá impacto direto não apenas no futuro de Bolsonaro, mas também na própria narrativa sobre a anistia de 8 de janeiro.
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